sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

O HUNSRÜCK DE NOSSOS ANTEPASSADOS*



Nossos antepassados alemães vieram da região de Hunsrück, na Alemanha.
"Reckershausen é uma pequena comunidade, cujo registro histórico mais antigo data do ano 1072. As atividades principais no século XIX eram a agricultura, a criação de animais domésticos (bois e vacas, cavalos, cabras e ovelhas, porcos, gansos,  que eram todos apascentados na floresta pelo pastor contratado pela comunidade) e um pouco de mineração. Em paralelo, a maioria exercia ainda um ofício, tais como alfaiate, sapateiro, tecelão, ferreiro, carpinteiro, construtor de carroças, peneireiro. No final de 2009 Reckershausen contava 381 habitantes e faz parte da municipalidade de Kirchberg. 
Reich é uma comunidade localizada em uma depressão no vale do rio Bieber e é mencionada por volta do ano 1600. Em junho de 2010 contava 387 habitantes. 
Biebern,  já mencionada no ano 754, realizou em 2004 as comemorações dos seus 1250 anos. No final de 2009 contava 313 habitantes. 
Reich e Biebern integram a municipalidade de Simmern (Siméria). A distância é de 3-4 km entre estes povoados e de aprox. 15 km até Buch, na municipalidade de Kastellaun (Castelânea). O registro mais antigo mencionando Buch data do ano 1052, e até a anexação francesa fazia parte do Principado-Arcebispado de Trier. No final de 2009 contava 928 habitantes.
Durante séculos os moradores de Reckershausen, Reich e Biebern eram servos do Mosteiro de Ravengiersburg, cujos priores eram juízes e proprietários de vasta extensão de terras até 1566, quando as terras e os servos passaram para os duques de Simmern e a partir de 1673 para os duques do Palatinado. Reckershausen, que também tinha súditos dos condes de Sponheim, em 1707 se tornou território do Marquesado de Baden. As áreas adjacentes do Hunsrück pertenciam a vários pequenos condados e ao Principado-Arcebispado de Trier, o arcebispo acumulando o poder religioso e temporal. Por séculos, a região foi disputada pela França, sendo várias vezes invadida, cidades e povoados saqueados e incendiados. Mesmo quando a própria região não era o palco das guerras, ainda assim era área de passagem para milhares de soldados e quem sofria as conseqüências desastrosas era a população. Na segunda metade do século XVIII o Hunsrück conheceu um breve período de prosperidade com o surgimento das primeiras indústrias ligadas à mineração, fundição e fabricação de utensílios domésticos, ferramentas, rocas, teares, pesos para balanças e similares. Até ser invadido pelas tropas revolucionárias de Napoleão em 1792 e posteriormente toda a área à esquerda do rio Reno foi anexada à França.
As repetidas guerras e invasões francesas devem ter sido experiências muito traumáticas, marcando profundamente o inconsciente desta população. Cento e cinquenta anos depois, do outro lado do Atlântico, os seus descendentes ainda pelejavam para se livrar dos “Franzose”, no caso a buva, uma planta selvagem, grande e vistosa, que insistia em reaparecer no meio das plantações. Pelo menos, é o que eu imagino agora ao conhecer a história e lembrar da minha infância na roça. Na época eu não sabia que Franzose significava francês, mas hoje, com alguma imaginação, posso ouvir o comentário dos imigrantes no dialeto do Hunsrück: “Krót so wie die Françose; dat kannste rúich áushacke, dat kimmt ávver doch nommo”. Em português seria: “Igualzinho aos franceses; você pode arrancar, mas eles sempre voltam”.
Importante ressaltar que a Alemanha como um país, uma unidade nacional, ainda não existia.  Nesta época, o território da futura Alemanha era mais semelhante a uma colcha de retalhos de cerca de 200 reinos, principados, ducados, condados, principados-bispados, cidades livres e outros pequenos domínios de nobres e clérigos, todos soberanos e independentes entre si, que após a ocupação francesa seriam reduzidos a 37 territórios, ainda independentes. O elo comum e fator de identidade alemã era a língua materna. Enquanto falavam muitos dialetos diferentes conforme as regiões, o idioma escrito e oficial era o alemão, para o qual Lutero havia traduzido a Bíblia.
Derrotadas as tropas de Napoleão, a partir de 1815 o Hunsrück passou a integrar a Província Renana do reino da Prússia e depois, em 1871, do Império Alemão, agora unificado e consolidado como uma nação. Desde 1946, o Hunsrück faz parte do estado de Rheinland-Pfalz (Renânia-Palatinado), no sudoeste da Alemanha.
A ocupação e posterior anexação francesa significou um pesado ônus, monetário e em vidas humanas: pesados tributos para financiar as guerras de Napoleão e o serviço militar obrigatório, com o recrutamento universal entre 18 e 40 anos para lutar nas suas guerras. Os que desertavam eram impiedosamente perseguidos e punidos. Para controlar quando os jovens estariam em idade de prestar o serviço militar, os franceses haviam confiscado os livros eclesiásticos (os registros civis só foram introduzidos pelos franceses em 1798). Com este mesmo objetivo, os prefeitos locais também eram obrigados a apresentar relatórios listando todas as famílias, indicando nome, idade e profissão de todas as pessoas adultas e todas as crianças acima de doze anos. Para evitar o recrutamento, nessa época muitos homens se casaram bem jovens, pois os casados não eram mais recrutados. Isso requeria uma licença especial e as solicitações eram minuciosamente examinadas. É bastante provável que Johann Adam Brand, o pai de nossos irmãos imigrantes, tenha conseguido essa licença, pois mal tinha 17 anos quando se casou com Anna Catharina Kunz em 1803. Certamente com o argumento de que sua mãe já era idosa (tinha mais de 60 anos), talvez também doente, e por isso havia a necessidade premente de uma mulher para cuidar da casa. Após cuidadosa verificação dos fatos, esse era o típico caso que justificava uma exceção e autorizava uma dispensa do serviço militar.
Como agora viviam em território francês e eram súditos franceses, tiveram de adotar a moeda francesa e o idioma oficial era o francês, que quase ninguém entendia, falava ou sabia escrever. As festas religiosas foram substituídas pelas festas revolucionárias da república francesa. Mas a maior confusão e rejeição era causada pelo calendário da  revolução francesa, com a semana de 10 dias,  com novos nomes de meses para cada estação do ano que iniciava em 22 de setembro, aniversário da república francesa.
Entretanto, o período francês também havia introduzido significativas mudanças sociais na esteira dos valores de liberdade, igualdade e fraternidade da Revolução Francesa, que a Prússia depois não conseguiria revogar na sua Província Renana. O Código Civil, que Napoleão implantou também na Renânia, abolia os privilégios de classes e tornava todos os homens (sic) iguais perante a lei (literalmente os homens, pois as mulheres ainda permaneciam excluídas destes direitos e continuavam meros apêndices dos homens). Supressão do sistema feudal e eliminação da servidão, passando de relações feudais entre senhor e servo para relações contratuais entre iguais; confisco de grandes propriedades agrárias, leiloadas em lotes menores, permitindo aos camponeses a propriedade de seu próprio pequeno pedaço de terra; sistema judiciário independente, sendo todos iguais perante a lei; liberdade de culto e de profissão; direito universal (sic) de votar (para os homens maiores de idade) são algumas destas conquistas.
Napoleão também impôs a vacinação de toda a população contra a varíola, o que diminuiu a mortalidade infantil, resultando em um progressivo aumento populacional. Por outro lado, a divisão igualitária da herança entre todos os filhos logo reduziu a tal ponto os lotes de terra que já não permitiam o sustento das famílias, frequentemente numerosas. Somem-se a isso sucessivas quebras de safra e tem-se, entre os anos de 1820 a 1845, uma situação econômica deplorável. A migração para as cidades também não oferecia melhores perspectivas. Com uma economia majoritariamente agrária, o Hunsrück era então, e continua até hoje, uma região pouco industrializada. Simplesmente não havia como empregar tantos trabalhadores. Os artífices, isto é, aqueles que tinham um ofício, tais como carpinteiro, ferreiro e similares, muitas vezes já não conseguiam manter a sua oficina. Com melhores chances de conseguir emprego, viam-se, no entanto, obrigados a longas e exaustivas jornadas de trabalho por salários que não remuneravam suas habilidades.
Foi neste contexto que chegou o anúncio da oferta de trabalho e de terras no Brasil, que entusiasmou ... tantos outros imigrantes do Hunsrück. Ao que parece, não deram ouvidos às autoridades prussianas que alertavam para os perigos e incertezas decorrentes de uma decisão de emigrar (os prefeitos das localidades tinham a incumbência de instruir e admoestar os incautos e até de impedir a realização de seu intento). Também não hesitaram diante da dificuldade de obter a autorização e o passaporte do governo prussiano. Calcula-se que seja maior o número dos que emigraram mesmo ilegalmente ...".

(Isolde Marx - outubro de 2010 / atualizado em outubro de 2011 - http://www.familiabrand.com.br/historico.php)

OS COLONOS DA FAMÍLIA BRAND*





  Imigrantes Brand - séculos XIX e XX


·      Três irmãos Brand no Brasil – Petrópolis - Tupandi
·      O Hunsrück de nossos antepassados
·      Os imigrantes Brand do Hunsrück são parentes


Brand - e suas variantes Brandt e Brant - é um sobrenome de origem germânica, que aparece em várias regiões da Alemanha e também em outros países da Europa. A adoção de um sobrenome (ou nome de família) a ser transmitido aos descendentes foi introduzida progressivamente entre os povos de língua germânica a partir do século XIII. Contudo, em regiões agrárias o sobrenome só se tornou generalizado por volta dos séculos XVII e XVIII. Há duas hipóteses prováveis para a origem dos sobrenomes Brand e suas variantes em várias regiões. Em alguns casos ele pode ter sido derivado de nomes com a terminação “brand”, tais como Hildebrand, Gerbrand, Sibrand. Em outros casos, ele pode ter se referido a alguém que morava em um determinado local em que ocorreu uma queimada (prática que era comum na agricultura) ou um incêndio, Brand em alemão.

Imigrantes Brand - séculos XIX e XX

No Brasil, registra-se nos séculos XIX e XX a chegada de várias famílias Brand e Brandt e também de imigrantes que chegaram desacompanhados e eventualmente se casaram aqui. Em alguns casos a grafia do sobrenome sofreu alterações nos registros eclesiásticos e civis, tanto antes quanto após a imigração, podendo encontrar-se irmãos com o sobrenome grafado de forma diferente. Hoje, os sobrenomes Brand, Brandt e Brant podem ser encontrados em quase todos os estados deste país. Entretanto, é importante ressaltar que fazem parte da família todos os descendentes, incluindo aquelas pessoas que já não tenham estes sobrenomes.
Em Petrópolis-RJ chegam, no final de 1845 ou início de 1846, Johann Nikolaus Brand e seu irmão Johann Adam Brand com a esposa e cinco filhos. O irmão deles, Christoph Brand, pode ter vindo também para Petrópolis ou ter vindo mais tarde direto para o Rio Grande do Sul (vide tópico Três irmãos Brand no Brasil – Petrópolis-Tupandi). Registra-se ainda a vinda a Petrópolis de seu parente Joseph Anton Brand, viúvo, e seus cinco filhos.  Vieram todos do Hunsrück (vide tópico Os imigrantes Brand do Hunsrück são parentes).
No Rio Grande do Sul, registra-se em 13.11.1846 a chegada de Felipe Brandt com sua esposa Felippina e os filhos Felipe Jacó Brandt, Felippina Brandt, Jorge Adão Brandt e Henrique Brandt. Posteriormente, registra-se a entrada de Henrique Brand em 26.02.1859 e de João Brand em 18.09.1860. Ernest Brandt e sua esposa Margarida Hermann e os filhos Carl Brandt, Christian Brandt, Frederico Brandt, Elisabetha Brandt, Mathilde Brandt, Ernestina Brandt e Florentina Brandt, naturais de Mecklenburg-Schwerin, se estabeleceram na colônia Mundo Novo e posteriormente em Linha Formoso. Em Feliz estabeleceu-se Joseph Brand e sua esposa Margaretha Zerwes (vide tópico Os imigrantes Brand do Hunsrück são parentes).
Em Santa Catarina registram-se imigrantes Brand e Brandt em várias colônias, tais como São Pedro de Alcântara, Vargem Grande, Teresópolis, Santa Isabel, Armação da Piedade, Joinville, São Bento do Sul, Brusque. Registra-se em São Pedro de Alcântara Maria Angela Brand casada com Heinrich Bohnen. Heinrich Gustav Brand estabeleceu-se na Colônia Teresópolis, no atual município de Águas Mornas com a esposa e os filhos Barbara Brand, Ludwig Brand, Margaretha Brand e Nikolaus Brand. Johann Christoph Brand casou-se com Maria Basília Sagaz e morou inicialmente na Armação da Piedade, vindo a estabelecer-se posteriormente em Brusque (vide tópico Os imigrantes Brand do Hunsrück são parentes). Em Brusque registra-se também Johannes Brand casado com Helene Becker. Oswaldo Brand casou-se em São Bento do Sul com Paulina Luiza, ambos naturais da Alemanha. Em Joinville registram-se diversos imigrantes Brand e Brandt: Friedrich Brandt chegou e foi embora em 1852; Hein Brandt chegou em 1856 proveniente de Horst, Prússia; Fr. Brandt, sua esposa Caroline e o filho Julius Brandt chegaram em 1856 provenientes de Pieritz; Dorothea Brandt, natural da Prússia, chegou em 1863; Heinrich Brandt, prussiano, chegou em 1869; Hans Brandt, sua mulher Christiane e sua parente Christiane chegaram em 1872 procedentes de Kolding, Dinamarca; Hermann Brand ou Brandt chegou em 1879 proveniente de Lutzig, Pommern; Ferdinand Brand, sua esposa Emma e os filhos Hermann Brand, Heinrich Brand, Paul Brand, Gustav Brand e Julius Brand aportaram em 1880 procedentes de Weisstein, Schlesien; Carl Brand, com Max, Richard, Eduard, e a mulher Anna com os filhos Ernst, Helene, Kurt, Margarethe e Carl chegaram em 1881; Georg Bernhard Albert Brandt e sua esposa Sophie Bertha Bachtold; Richard Brand, sua esposa Caroline Beckh e filhos, entre eles Rudolph Conrad Brand chegaram em 1883; Robert Brandt em 1885; Ernst Brandt chegou em 1888 procedente de Rüstlihausen, Prússia; Alexander Brand em 1889; Fritz Brand chegou em 1890 procedente de Gernsheim, Hessen; Catharina Brands procedente de Recklinghausen.
Fritz Brandt, nascido em Blankenese, Holstein chegou ao Brasil através do porto de Recife e estabeleceu-se na cidade de Mirador no Maranhão, onde se casou com Andreina de Almeida e Silva. Registra-se em 1880 a vinda de Fritz Brand, também proveniente de Blankenese, para o Rio de Janeiro. Richard Ambrosius Brand chegou na década de 1880. Alfred Brandt e Dorette Evers, procedentes de Hannover, desembarcaram no porto do Rio de Janeiro em 1910 com os filhos Helmuth Brandt, Alfred Brandt, Maria Arnoldina Brandt, Dora Mirna Brandt e se estabeleceram na cidade de São Paulo. Herbert Ludwig Adolf Brand veio para o Brasil por volta de 1925 e se estabeleceu no Rio de Janeiro, onde se casou com Izar Teixeira. Seu irmão Kurt Brand já residia em Mogi das Cruzes-SP. Sua irmã Gertrud Brand chegou em 1927 em São Paulo. Eram provenientes da região de Grossenhain e Mittweida, Sachsen. Renate Katharina Brandt veio de Wohnste em 1986.
Esta lista de imigrantes provavelmente não está completa. Se seus antepassados imigrantes não estão incluídos, por favor, envie-nos suas informações.
A família Caldeira Brant encontra-se no Brasil desde o século 18, proveniente de Portugal, e muitos descendentes hoje portam apenas o sobrenome Brant. Na verdade, esta família descende do belga Jan van Brabant (filho de Paul van Brabant e Cornelia Keteler), que se naturalizou português com o nome de João Caldeira Brant.

Três irmãos Brand no Brasil – Petrópolis - Tupandi

Johann Adam Brand (naturalizado Adão Brand e mais conhecido como Adão Brand I em Petrópolis), Johann Nikolaus Brand (naturalizado João Nicolau Brand) e Christoph Brand (naturalizado Christóvão Brand) nasceram em Reckershausen, na região do Hunsrück, filhos do casal Adam Brand (1786-1846) e Anna Catharina Kunz (1785-1825. A mãe havia falecido no parto de Christoph, o pai falecerá, também em Reckershausen, pouco mais de um ano após a emigração dos filhos. Estes vieram para trabalhar nas obras de construção da cidade e do palácio imperial de Petrópolis.
Em 1830 Dom Pedro I comprara a Fazenda Córrego Seco no alto da Serra da Estrela como estância de veraneio e pretendia construir ali o Imperial Palácio da Concórdia. Com sua abdicação ao trono em 1831 e sua morte em 1834, as terras passaram para seu filho. Por um decreto de 1843, D. Pedro II arrenda as terras para o major e engenheiro Júlio Frederico Koeler, incumbindo-o da construção do Palácio Imperial, da urbanização de uma Vila Imperial com prazos de terra a serem aforados a particulares, da edificação da igreja dedicada a São Pedro de Alcântara e de um cemitério. Com a aquisição de várias outras fazendas, a área restante da Imperial Colônia de Petrópolis seria destinada à criação de uma colônia agrícola alemã, que deveria prover o palácio e a povoação imperial e também abastecer de produtos agrícolas a corte e a cidade do Rio de Janeiro.
Natural da cidade de Mainz, ainda jovem Koeler ingressara no exército prussiano. Imigrou em 1828, contratado para servir no exército imperial do Brasil. Naturalizado brasileiro, realizou importantes obras públicas na província do Rio de Janeiro, como a construção de aquedutos, edifícios públicos, pontes e estradas. Ele elaborou a planta da povoação-palácio de Petrópolis, um planejamento urbanístico complexo e detalhado para uma cidade a ser erguida entre montanhas, aproveitando o curso dos rios para traçar às suas margens as avenidas e ruas que davam acesso aos prazos de terra que, por sua vez, davam fundos para as matas a serem preservadas nas encostas. O projeto seria executado com recursos públicos e da iniciativa privada mediante a venda de ações da Companhia de Petrópolis na recém-criada Bolsa de Valores, assim possibilitando a contratação de trabalhadores livres, que Koeler preferia à mão-de-obra escrava em suas obras. Petrópolis seria erguida com o trabalho dos colonos germânicos.
Em junho de 1844 a província do Rio de Janeiro contratou com a Casa Charles Delrue & Comp. da cidade portuária de Dunquerque, França, o agenciamento e transporte de 600 famílias de colonos. Estes deveriam ter entre 18 e 40 anos, “ser robustos e bem morigerados (ser educados e ter bons costumes), além de serem hábeis nos ofícios de carpinteiro, ferreiro, pedreiro, canteiro, cavouqueiro e trabalhadores de estradas. As ferramentas obrigatoriamente deveriam estar incluídas nas bagagens.” Foi assim que, entre 13 de junho e 08 de novembro de 1845, chegaram ao Rio de Janeiro 13 navios trazendo 2.318 pessoas provenientes da Renânia, então uma província do reino da Prússia (Preussen). Destas, 106 pessoas pediram para serem assentadas no Rio Grande do Sul, onde já tinham parentes, 26 pessoas permaneceram na cidade do Rio de Janeiro, 75 pessoas faleceram antes de chegarem à terra prometida em Petrópolis, onde afinal foram assentadas 569 famílias, totalizando 2.111 pessoas.
Em um jornal da época, especializado em emigração, ficamos sabendo que os agentes de Charles Delrue teriam feito promessas falsas, entre elas a total gratuidade da passagem quando, na verdade, o governo fluminense estava apenas antecipando o valor do pagamento que seria depois descontado dos trabalhadores na proporção de 1/4 a 1/6 dos seus vencimentos, a depender do tamanho da família. Com esta e outras promessas falsas, a empresa não apenas teria agenciado um número muito superior de migrantes, como também embarcado, no espaço de três meses, os trabalhadores que eram esperados no Brasil ao longo de vários anos. Apenas entre 20 e 26 de julho chegaram ao Rio de Janeiro 1.011 pessoas. Isto criou sérios problemas devido à falta de alojamentos, à necessidade de ocupar tantos trabalhadores de imediato e, além disso, faltava medir e demarcar a quase totalidade dos terrenos. O governo brasileiro ainda tentou suspender novos embarques, mas, até que a ordem chegasse à França, outras sete embarcações haviam zarpado.
Quando em agosto de 1846 as autoridades francesas anunciaram que não haveria mais embarques por conta do governo brasileiro, outras centenas de pessoas empobrecidas aguardavam o embarque no porto de Dunquerque. Como não tinham recursos para custear a passagem e não tinham para onde voltar, ao recorrerem ao cônsul da Prússia naquela cidade, este teria respondido que “tinham deixado de ser cidadãos prussianos e por isso não tinham direito à sua intervenção”. De fato, os emigrantes prussianos tinham de abrir mão de sua nacionalidade, o que significava que eles agora não eram cidadãos de parte alguma. Finalmente, o governo francês teria lotado três navios de guerra e transportado 700 pessoas para a Argélia, colônia francesa no norte da África.
Entretanto, como os agentes da Casa Charles Delrue continuavam sua propaganda no Hunsrück, outras centenas de pessoas continuavam a chegar e aguardavam o embarque nos portos de Ostende e Antuérpia na Bélgica, impedidas de entrar em território francês. Pressionado pela Bélgica e pela própria imprensa, o reino da Prússia afinal se viu obrigado a receber de volta sucessivas levas de migrantes, que a Bélgica transportava até a sua fronteira. Inicialmente, as pessoas eram levadas para o Abrigo dos Pobres (Armenhaus) em Brauweiler e depois reconduzidas às suas cidades de origem, muitas vezes encontrando forte oposição da população local. Numa época em que milhares de alemães emigravam para a América do Norte, Austrália, Hungria, Brasil e vários outros destinos, houve cidades que pagaram as passagens para os seus pobres emigrarem. Vale mencionar que o Brasil é apresentado por aquele jornal como um país que, graças ao seu governo, oferecia condições para os seus imigrantes prosperarem (os primeiros imigrantes germânicos tinham vindo duas décadas antes).
Estes fatos, assim como o relato a seguir certamente ilustram os motivos que levaram tantas famílias a buscarem aqui novas oportunidades. O redator do jornal relata haver testemunhado o desespero de um grupo destes migrantes na Bélgica que, diante da proposta de serem transportados de volta, teriam declarado que “preferiam lançar-se ao mar a voltar para o Hunsrück, onde não haviam possuído nada e também nunca poderiam chegar a ter algo, e onde - sobretudo no inverno - faltavam todos os meios de se ganhar o mínimo com o próprio trabalho”.
Melhor fortuna tiveram os Brand, que conseguiram embarcar no penúltimo dos 13 navios. O veleiro “Pampa”, que zarpou de Dunquerque com 138 passageiros sob o comando do capitão Wordinger em 23.08.1845, aportou no Rio de Janeiro 54 dias mais tarde, em 16.10.1845 com 137 colonos. Após a penosa travessia marítima, começava uma etapa ainda mais sofrida para muitas famílias, pelo fato de que no alto da serra não havia onde abrigar tantas pessoas de uma vez, sendo os colonos obrigados a longa permanência em abrigos improvisados ao longo do caminho, condições que foram fatais para pessoas já debilitadas pela viagem, principalmente crianças. Devemos lembrar que muitas pessoas provavelmente tiveram dificuldades para alimentar-se durante a travessia, devido ao enjôo causado pelo balanço do mar.
Primeiro tinham de passar pelo período de quarentena, mal-acomodados em depósitos superlotados em Niterói. Depois, atravessando a Baía de Guanabara, em pequenas embarcações viajavam cerca de nove horas até o porto da Estrela às margens do rio Inhomirim, na Baixada Fluminense. Aqui muitas famílias ficaram abrigadas provisoriamente em barracões até que houvesse vagas para acomodá-las mais adiante, na Raiz da Serra, nas instalações da Fábrica de Pólvora da Estrela. Ali chegavam após uma jornada de quatro horas feita a pé, mulheres e crianças em carros puxados por várias juntas de bois, a bagagem no lombo de mulas, conforme escreve um imigrante. Neste local ocorreu a maior parte das mortes, causadas principalmente por diarréia e febre tifóide devido às deficientes condições de asseio, alimentação e saúde. No cemitério de Inhomirim, que ficava nas imediações da Fábrica de Pólvora, registra-se o sepultamento de vários adultos e dezenas de crianças, motivo pelo qual passou a ser chamado Cemitério dos Anjos. Finalmente, a subida da serra era feita a pé ou no lombo de mulas pelo Atalho do Caminho Novo, uma trilha de tropeiros que ligava o Rio de Janeiro às Minas Gerais, com uma escala no Meio da Serra, onde existiam ranchos para os viajantes.
Chegados, enfim, a Petrópolis, ficavam mais uma vez abrigados em barracões. Conforme relata um imigrante, a vida era muito cara em Petrópolis e, após a chegada, tinham de arcar com as despesas de sustento da família, além de ressarcir o governo pelas despesas da viagem. Para isso, trabalhavam nas obras públicas da cidade como abertura de estradas, canalização de rios e calçamento das ruas centrais, construção do Palácio de D. Pedro II ou ainda de outras residências e palacetes da aristocracia brasileira, que viria passar os meses de verão (de novembro a maio) em Petrópolis. Depois de receberem os seus prazos de terra cobertos de mata, tinham de limpar o terreno e construir sua casa com o próprio material nele encontrado. Assim, finalmente, podiam voltar a ter um lar.
Foram medidos e demarcados 851 prazos (lotes) de terra nos vales dos rios, distribuídos em 2 Vilas Imperiais e 22 Quarteirões (tradução literal da palavra Viertel, que em alemão significa bairro). Os nomes de muitos quarteirões lembravam cidades ou regiões da terra natal dos imigrantes, tais como Quarteirão Bingen, Nassau, Ingelheim, Renânia, Palatinado, Castelânea, Siméria e outros. Os prazos de terra designados para os Brand eram prazos de quarta classe, mais distantes da Vila Imperial e destinados aos agricultores, medindo em torno de 5.000 braças quadradas. Tinham isenção de oito anos para começarem a pagar a jóia de 20$000 (20 Mil-Réis) e o foro anual.
Adão Brand recebeu a gratificação imperial de 35$000 (35 Mil-Réis para família de 7 pessoas) para si, sua esposa Anna Catharina Huhn e cinco filhos: Jacob, Anna Margarida, Pedro, Adão e João. Seu prazo de terra é o de n° 3420, no Quarteirão Presidência, à margem do Rio Cavalcanti, com área de 7200 braças quadradas. Antes de emigrar, a família havia residido em Reich (municipalidade de Simmern) e freqüentava a paróquia de Biebern. Em Petrópolis nasceram as filhas Estephania e Anna Maria. Muitos de seus descendentes vivem ainda em Petrópolis ou em outras cidades do estado do Rio de Janeiro.
João Nicolau Brand recebeu a gratificação imperial de 10$000 (10 Mil-Réis para duas pessoas) e o prazo de terra n° 4207 no Quarteirão Renânia Superior, medindo 5.725 braças quadradas, mediante pagamento da jóia de 20$000 (vinte Mil-Réis), mais foro anual de 5,72 Réis. Ficava às margens do rio Quintandinha na frente e do rio Siméria na lateral, e não muito longe do prazo de terra de seu sogro, Antonio Platten.  O casamento de João Nicolau Brand com Anna Maria Platten certamente se deu em Petrópolis, onde se registra, entre 25.11.1847 e 22.05.1859, o nascimento de sete filhos do casal: Catharina, Jacob, Margarida, Anna Maria, Elisabeth, Maria e Francisca.
Não demorou muito para se constatar o “fracasso colonial agrícola devido às terras inférteis, aos vales estreitos e úmidos e às vertentes de declividades acentuadas sujeitas a erosão”, sem falar da pequena extensão das propriedades. Além disso, a partir da emancipação de Petrópolis em 1857, as verbas do governo destinadas para a Imperial Colônia começaram a escassear até serem praticamente abolidas a partir da instalação da Câmara Municipal em 1859. A Imperial Colônia Germânica de Petrópolis, inaugurada em 1845, foi extinta em 06.01.1860. Com a redução de obras públicas e particulares, fonte de subsistência para muitas famílias (as fábricas de tecidos só seriam instaladas a partir de 1873), vários colonos deixaram Petrópolis em busca de melhores oportunidades, incluindo João Nicolau Brand e sua família. Seu prazo de terra, cujo título havia recebido em outubro de 1858, foi vendido a Pedro Theodoro Forster em dezembro de 1859.
Conforme registros no Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul, a família chega a Porto Alegre em 14.01.1860 através de Rio Grande, a bordo do vapor Marquês de Caxias, provenientes de Petrópolis. Registros 5089-5097 fls. 162/163 para o casal e sete filhos, a saber: Catharina (12 anos), Jacob (10), Margarida (8), Anna Ma. (6), Elisabeth (4), Maria (3), Francisco (9 meses). A família se estabelece no atual município de Tupandi, então pertencente ao município e à paróquia de Triunfo. Na época, a comunidade chamava-se Picada São Salvador, em 1939 o nome muda para Natal e em 1945 para Tupandi. Em 1860 São Salvador contava 20 famílias e os moradores decidiram comprar meia colônia de terra para edificar uma escola, que também lhes serviria de igreja até a construção de uma capela em 1866, quando já se contavam 80 famílias. Ali João Nicolau Brand e Anna Maria Platten teriam ainda outros seis (ou talvez sete) filhos, a saber: Bárbara, Nicolau, Philomena, Teresa, Antonio Jacob, Susana. No necrológio (Todesanzeige) de Anna Maria Brand, nata Blatten, menciona-se que a falecida deixa 11 filhos, 115 netos e 59 bisnetos, enquanto 3 filhos e o seu esposo a haviam precedido na morte. Seus descendentes se espalharam pelo Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e vários outros estados e países.
Antonio Platten e sua esposa Anna Susanna Andres, os pais de Anna Maria Platten,  vieram de  Buch, municipalidade de Kastellaun, também no Hunsrück. Ele recebeu a gratificação imperial de 25$000 (25 Mil-Réis para família de 5 pessoas) e o prazo de terra n° 2014 no Quarteirão Siméria. Sabemos que o menino Antonio Blatten foi sepultado no Cemitério dos Anjos de Inhomirim em 20.10.1845. As filhas Catharina Platten e Maria Platten são madrinhas das sobrinhas Catharina Brand e Maria Brand, respectivamente. Em Petrópolis registra-se em 07.10.1856 o casamento de Maria Margaretha Platen, nascida em 1838, com Valentim Sperle II. E há vários registros de batismo de filhos de Catharina Platten e João Wendling, que também foi padrinho de Francisca Brand.
De Christóvão Brand, o único registro que temos até o momento é o de sua morte (Tupandi, registro católico de óbitos 1,18v), alfaiate, falecido em 24.11.1888 em consequência de picada de serpente. Como seu nome não aparece nos registros de Petrópolis, é possível que tenha vindo mais tarde diretamente para Tupandi.

... 

Os imigrantes Brand do Hunsrück são parentes
O primeiro Brand de que se tem notícia na região do Hunsrück é Hans Peter Brand da localidade de Womrath, que foi casado primeiramente com Elisabeth Getrud (falecida em 16.04.1695 aos 53 anos). Em 07.05.1697 o viúvo Hans Peter Brand casou-se com Agnes Kauffmann. É de seus filhos Johann Michael Brand e Tilmann Brand que descendem os vários imigrantes Brand do Hunsrück identificados até este momento no Brasil.
De Johann Michael Brand descendem os três irmãos Johann Adam Brand, Johann Nikolaus Brand e Christoph Brand de Reckershausen. Eram filhos de Johann Adam Brand (1786-1846) e Anna Catharina Kunz (1785-1825), netos de Johann Adam Brand (1736-?) e Anna Gertrud Thomas (1740-?), bisnetos de Johann Adam Brandt (1713-?) e Anna Catharina Müller (1715-1758), trinetos de Johann Michael Brandt (?-1738), que se casou com Maria Catharina Christ (1685-?) em 1709, iniciando a história da família Brand em Reckershausen. Em Biebern e Fronhofen vivem atualmente descendentes de Catharina Brand, a irmã mais velha dos três irmãos imigrantes.
Tilmann Brand e sua esposa Anna Elisabeth são antepassados dos Brand de Biebern, descendentes de seu filho Johann Michael Brand, que ali se estabeleceu em 1738 ao se casar com Anna Maria Johann. De lá imigraram os primos Johann Christoph Brand (filho de Johann Christoph Brand e Anna Catharina Wust) e Joseph Brand (filho de Johann Nepomuk Brand e Anna Elisabeth Christ), assim como o tio deles, o imigrante Joseph Anton Brand (filho de Johann Christoph Brand e Maria Margaretha Wust, neto de Johann Michael Brand e Anna Maria Johann).
Não se sabe ao certo quando Johann Christoph Brand (naturalizado Cristóvão Brand) imigrou, mas é provável que tenha sido em 1847, pois residiu primeiro na Armação da Piedade, colônia fundada naquele ano no atual município de Governador Celso Ramos-SC. Consta que se casou em 04.03.1848 na Catedral de Florianópolis com Maria Basília Sagaz e seus filhos foram batizados na capela da Piedade e na Matriz de São Miguel da Terra Firme, atualmente Biguaçu-SC. Posteriormente a família se estabeleceu em Brusque, pois a Colônia Piedade não prosperou e seus habitantes se dispersaram.
Joseph Brand (naturalizado José Brand) veio com sua esposa Margaretha Zirwes (no Brasil Margarida Zerwes/Zerbes/Cerbes) e sua filha Margaretha (Margarida Brand) nos primeiros anos da década de 1850, estabelecendo-se na Picada Feliz-RS. Viúvo, casou-se em 1870 com Bárbara Sauer. Registros de batismo e casamento de seus filhos e netos encontram-se a partir de 1856 nos livros de São José do Hortêncio, Ivoti, Tupandi, Bom Princípio, Santo Inácio da Feliz.
Joseph Anton Brand (naturalizado José Brand), viúvo de Maria Sophia Härter também imigrou para Petrópolis em 1845 com os filhos Anna Catharina Brand, Joseph Brand, Anna Elisabetha Brand, Matthias Brand e Johann Brand. Recebeu o prazo de terra n° 3419 no Quarteirão Presidência, contíguo ao de Adão Brand.
Do ramo de Biebern também descende Hans Werner Brand, que veio de Biebern com sua família em abril de 2011 para participar do VII Encontro da família Brand em Florianópolis. Seu trisavô Peter Brand era irmão do imigrante Johann Christoph Brand (Brusque). Outro irmão deles, Johann Brand, também teria emigrado e retornado do Brasil, vindo a falecer em Biebern, conta Hans Werner Brand. Ainda não encontramos registros que confirmem a passagem dele por aqui.
Talvez venhamos ainda a descobrir outros parentes Brand no Brasil, na Alemanha ou mesmo em outros países.
(Isolde Marx - outubro de 2010 / atualizado em outubro de 2011 - http://www.familiabrand.com.br/historico.php)


COLONOS PIONEIROS ALEMÃES NOS ESTADOS DO RIO GRANDE DO SUL, PARANÁ E SANTA CATARINA*



É sabido que os alemães já visitavam e imigravam para o Brasil antes do fluxo imigratório. Mas com o agravamento dos problemas políticos e econômicos da Alemanha, em 1824 o processo inicia-se em grande escala. Os imigrantes alemães a princípio fixaram-se no Rio Grande do Sul e Paraná, depois Santa Catarina e Espírito Santo. Devido a unificação da Alemanha o fluxo imigratório é interrompido a partir de 1870.

13 de janeiro de 1824 - O primeiro navio, uma galera holandesa chamada ARGO aportou no Rio de Janeiro. Estes primeiros alemães foram enviados à Nova Friburgo.

13 de abril de 1824 - O segundo navio, galera hamburguesa chamada CAROLINA aportou no Rio de Janeiro e estes imigrantes foram também enviados à Nova Friburgo.

04 de junho de 1824 - O terceiro navio, outra galera hamburguesa chamada ANNA LUISE trouxe os alemães que instalaram-se na Província de São Pedro, hoje Rio Grande do Sul.

Aos fins de abril de 1828 embarcaram em Amsterdam com destino ao Brasil umas 60 famílias alemães originárias dos distritos de CochemA no Eifel. Os demais embarcaram em Bremen, nos navios alemães JOANNA JOKOBS (ou JACOBS) e CHARLOTTE LOUISE. Estas famílias foram destinadas à Colônia de São Pedro de AlcântaraB em Santa Catarina. A viagem marítima naquele tempo poderia levar até 90 dias, sendo que mulheres e crianças viajavam nos porões e os homens no tombadilho.

Junho de 1828 JOANNA JOKOBS aporta no Rio de Janeiro. Seus tripulantes ficaram na região por um período aproximado de 60 dias para então poder embarcar com destino à Desterro, hoje Florianópolis - Santa Catarina.

02 de outubro de 1828 o brigue CHARLOTTE ET LOUISE aportou no Rio de Janeiro, tendo partido de Bremem no dia 07 de junho do mesmo ano (em outros relatos consta dia 30). Este mesmo brigue chegou a fazer duas viagens da Alemanha ao Brasil.

28 de outubro de 1828 dois bergantis chamados LUIZA e MARQUÊS DE VIANNA partiram do Rio de Janeiro com destino à Desterro, por ordens do Inspetor de Colonização Estrangeira Monsenhor Pedro Machado de Miranda Medeiros. Os bergantis transportaram 146 famílias, totalizando-se em 635 pessoas: 523 pessoas eram provenientes de Bremem, originários da região de Eifel, sudoeste da Alemanha, ao norte do Rio Mosela (margem esquerda); mais 93 homens liberados da Legião Alemã (corpo da tropa de mercenários alemães no Exército Imperial Brasileiro que foram dissolvidos na Capital do Império); e 19 ex-integrantes do 27o Batalhão de Caçadores da Província de Santa Catarina, igualmente dissolvidos.

07 de novembro de 1828 - brigue LUIZA aportou em Desterro transportando 276 pessoas. No entanto por haverem adoecido durante a viagem, os imigrantes alemães from hospedados involuntariamente, completamente isolados na Armação da Lagoinha, antigo estabelecimento de pesca de baleias fundado na costa oriental da Ilha de Santa Catarina. Encontravam-se no local o 14o Batalhão do Exército. Neste estabelecimento os imigrantes receberam assistência médica por conta do governo provincial.

12 de novembro de 1828 - brigue MARQUÊS DE VIANNA aportou em Desterro trazendo 359 pessoas. Os tripulantes ficaram alojados em quartéis da cidade (campo de manejo), juntos aos Batalhões 4o, 8o, 18o, 27o de artilharia.

15 de janeiro de 1829 - imigrantes alemães vindos no Charlotte et Louise, foram do Rio de Janeiro transportados em navio nacional com direção ao sul do país, desembarcando primeiro em Antonina - PR, localidade denominada Porto de Cima.

06 de fevereiro de 1829 – De Antonina foram transportados para Rio Negro ficando lá em verdadeiro estado de abandono. E provavelmente alguns imigrantes permaneceram nestas localidades, pois historiadores marcam esta data 06 de fevereiro a de fixação da primeira colônia germânica do Estado, instalada em Mafra na região do Contestado, 24 dias antes da chegada dos alemães em São Pedro de Alcântara.

11 de fevereiro de 1829 - os primeiros imigrantes alemães, a maioria trazidos pelo Marquês de Vianna, foram levado à São José. Os alemães trazidos pelo brigue LUIZA foram levados à Colônia de São Pedro durante os meses do ano de 1829.

01 de março de 1829 – (data de fundação) a ocupação da Colônia São Pedro de Alcântara ocorreu. Esta colônia consistia na grande Florianópolis: Sede de Colônia, Santa Filomena, Vargem Grande (fundada em 1837), Leopoldina. E Colônia Itajahy no médio Vale do Itajahy.

Em novembro de 1829 - navio LUCINDA aportou trazendo mais 50 colonos, quase todos soldados do 28o Batalhão da Corte.

Em decembro de 1830 - paquete SANTA CATARINA trouxe mais 9 pessoas.01 de março de 1831 - charrua CARIOCA aportou trazendo 14 colonos que foram destinados à Colônia São Leopoldo.

Em 1836 e 37 várias famílias insatisfeitas com o solo precário da Colônia decidiram partir para a Colônia de Belchior no Itajahy-Açu. Outros obtiveram terras fundando a Colônia de Vargem Grande. E muitas outras famílias direcionaram-se para o Vale do Rio Itajahy, Arraial da Barra (Itajahy), Margens do Itajahy Mirim, Belchior, Pocinhos e Gaspar.

13 de abril de 1844 – A Colônia São Pedro de Alcântara eleva-se à categoria de Freguesia.

Por volta de 1846 - brigue ERIDANO levou imigrantes alemães provindos da Baviera e Holstein, do porto de Dunquerque (França) para o Brasil. No Rio de Janeiro embarcaram no bergantil VÊNUS com destino a Desterro.

28 de dezembro de 1846 - aportava em Desterro estes 114 alemães sendo 28 famílias das regiões de Loffelscheidt (aldeia de Hunsruck), Zell e Hirschfeld.

Março de 1847 - o segundo navio 14 DE NOVEMBRO trouxe duas levas de imigrantes entre 79 ou 81 pessoas. O terceiro era a galeota belga JEAN DE LACQUENGHIEN com 64 imigrantes (13 famílias e 3 homens solteiros) todos protestantes.Todos os imigrantes vindos no VÊNUS, 14 DE NOVEMBRO e JEAN DE LACQUENGHIEN estabeleceram-se na Colônia Santa Isabel.Em 1860 haviam 59 famílias com 258 indivíduos nesta colônia.

Entre junho e outubro de 1861 esta mesma colônia recebeu mais 281 pessoas. Em Palhoça os alemães eram procedentes de Pomerânia, Holstein, Saxônia, Westfalia, Oldemburg, Renânia, Baviera, Hunsruck, Palatinado, Hesse, Prússia, Wurtemberg, Saxe, Bremmen. Em São José os alemães eram procedentes da Renânia Meridional, parte do chamado Hunsruckc, e parte da margem do Rio Mosela, mais ao norte.

16 de abril de 1994 – A Freguesia São Pedro de Alcântara torna-se município.


*(Daisy Regina Llock em http://drk-historia.blogspot.com.br)

RESUMO DO "DIÁRIO DO IMIGRANTE MATHIAS SCHMIZ" - 1867


Mathias Schmiz veio para o Brasil em 1845, aos 20 anos de idade, acompanhado de seus pais, e de mais 11 famílias, abandonando o pequeno lugarejo onde nasceram,  Loeffeischeidt no Hunsrück, Alemanha, no dia 9 de outubro daquele mesmo ano. Depois seguiu-se uma difícil e tormentosa viagem de navio pelo Oceano Atlântico, até o Brasil, que durou longas seis semanas. Ele foi residir na cidade de Theresopolis, no Estado de Santa Catarina. Segue abaixo um pequeno resumo de seu "Diário", para dar-nos uma idéia de como viviam nossos antepassados na antiga Alemanha, bem como assim das enormes dificuldades dessa aventura pelos mares porque passaram, rumo ao Novo Mundo.

Diz Mathias:


"Já como escolar e mais ainda como adolescente, eu tinha uma aversão enorme pela emigração e principalmente para o Brasil. Somente ao ouvir o nome já sentia arrepios, porque imaginava a terra bem diferente do que mais tarde conheci.

Eu imaginava uma terra totalmente selvagem, onde seus moradores eram seres humanos só na denominação e que mais se pareciam com animais. Uma terra na qual, atrás de cada arbusto, corria-se o risco de ser mordido por uma cobra ou outro animal selvagem.
Uma terra onde não se podia dar um passo em segurança, sem o perigo de ser preso, morto e assado pelos selvagens, que acompanhavam os moradores.
Mas mesmo com todos estes perigos em mente: seja como Deus quiser! Aqui na Alemanha não há futuro para mim. Eu resolvi acompanhar, aos 20 anos, meus pais e mais outros emigrantes para o Brasil.
Onze famílias, entre as quais estavam filhos e filhas já adultos. Partiram certo dia, cantando alegremente, do pequeno lugarejo de Loeffeischeidt no Hunsrück, para um novo lar. Muitos dos emigrantes derramaram lágrimas amargas ao se despedir de parentes e amigos, pois era um adeus para sempre. Depois que paramos por alguns minutos numa elevação, até onde quase todos os moradores do lugar nos acompanhavam, eu também com olhos marejados de lágrimas, olhei pela última vez o lugar onde nasci. Por pouco não desistia da viagem, se meus amigos que também partiram não me tivessem encorajado, afirmando sempre que só no Brasil encontraria a felicidade. Logo me senti mais confiante e, assobiando alegremente, subi nas caixas e cofres que estavam amontoados numa carroça e lá seguimos pela estrada até o Reno. Numa pequena cidade de nome B., localizada lá mesmo, pernoitamos. O cuidado com a bagagem ficou a cargo dos mais velhos e nós, moços, fomos à próxima taberna, onde, com uma boa garrafa de vinho e alegres brincadeiras, permanecemos até o dia raiar. Logo de manhã, caixas e malas foram levadas até o vapor que nos levou até Köeln. Ficamos um dia nesta bela cidade; admirava surpreso as bonitas vitrines. Visitei a igreja, onde numa prece pedi proteção a Deus para a viagem que teríamos que enfrentar. No outro dia, era 10 de outubro, seguimos de trem para Ostende, uma cidade na Bélgica e de lá partiríamos até a cidade de Dunquerque, na França, onde nos esperaria um veleiro que nos levaria ao Brasil.
...

No ano anterior, 1845, antes de emigrarmos, foi fundada no Brasil uma nova cidade de nome Petrópolis (residência de verão do imperador) e que diziam fora colonizada quase exclusivamente por alemães. Por este motivo o governo brasileiro fez um contrato com um certo armador de nome D., da cidade portuária de Dunquerque, na França, e que, por conta do governo brasileiro, levaria certo número de emigrantes até a cidade do Rio de Janeiro, para colonizar Petrópolis. Para reunir estes emigrantes, o citado senhor D. contratou vários agentes que angariavam pessoas interessadas em vir ao Brasil. Verdade é que o número de emigrantes aquele ano foi tão grande que ultrapassou o número estipulado. Apesar do governo brasileiro correr com todas as despesas dos emigrantes, estes ainda eram enganados e explorados pelos agentes. Tinham muitas vezes que entregar até a última moeda que possuíam. No ano seguinte, ano em que eu emigrei, os agentes espalharam que mais um determinado número de emigrantes podia partir para o Brasil, e somente as despesas até a cidade portuária seria por conta de cada um. Além de tudo, o Brasil era lembrado como paraíso na terra. As pessoas recebiam boa terra e uma bonita casa, tudo livre de qualquer despesa. Não era de admirar portanto que tantas pessoas se punham a caminho do Brasil. Na maioria eram pessoas que na Pátria nada mais tinham a perder e que mal conseguiam reunir o dinheiro para chegar à cidade portuária de França. Mas muitos pensavam: 'você conseguirá levar os teus, mesmo que tenhas que passar fome e sede, serás recompensado pelo governo; ele prometeu e deverá cumprir a promessa'. Mas tudo foi bem diferente. Logo que os emigrantes chegaram a Dunquerque, o armador exigiu o preço da passagem na íntegra, dos que queriam ir ao Brasil. Mesmo o argumento de que o governo se incumbiria do pagamento ele não aceitou. Sua resposta foi de que ele nada tinha com o governo brasileiro, e que cada um devia cuidar de si mesmo. Agora então tivemos o conhecimento de que fomos enganados e alguns que ainda possuíam um pouco de dinheiro pagaram o exigido. Alguns veleiros foram aprontados para receber os emigrantes. A maioria no entanto tinha que aceitar o destino. Não podiam seguir para o Brasil e o que era pior, também não podiam voltar. Quem encontrava trabalho na cidade ficava e muitos foram mendigar. Diariamente o número de enganados aumentava de tal maneira que a cidade sofreu uma enchente de alemães, que por força maior tiveram que pedir seu pão na porta de moradores. A miséria tornou-se por fim tão grande que o governo francês expediu vários navios com estes alemães logrados para a África, só para livrar a cidade do excesso de pessoas. Por fim nenhum emigrante podia mais passar a fronteira da França sem apresentar antes um certificado de armador D., no qual constava que o frete da bagagem estava pago e D. se comprometia oferecer hospedagem e comida ao referido emigrante, e quando se apresentasse oportunidade, enviaria o mesmo ao Brasil.
Justamente nesta época, cerca de 40-50 famílias, entre as quais eu também me encontrava, estávamos prontos a viajar de Oeste para a cidade portuária Dunquerque. Aconteceu um grande contratempo. Recebemos a notícia de que não nos era permitido atravessar a fronteira sem apresentarmos o exigido certificado. Se não tivéssemos dinheiro suficiente para cobrir as despesas seria melhor voltar para casa ... Já não tínhamos mais casa nem propriedade. Por felicidade estava conosco o agente do armador D., por ordem do qual nós empreendemos a viagem. Este se vira obrigado a nos acompanhar, porque eu estava de posse de algumas cartas do agente e se as mesmas caíssem em mãos da polícia, ele seria preso e invariavelmente condenado por fraude. Somente o medo levou-o a interceder junto ao armador D. para que fôssemos transportados, não de todo gratuitos, mas por um preço baixo. Este agente, como ele mesmo contara, também tinha sido enganado pelo armador, pois o mesmo lhe afirmara que as condições da viagem eram as mesmas do ano anterior, isto é, por conta do governo brasileiro (citado agente, mais tarde teve que abandonar a Europa clandestinamente, porque era perseguido pela polícia). Veio ao Brasil, onde eu pessoalmente falei com ele, pois ficou vários dias na colônia alemã. Logo desapareceu e foi encontrado mais tarde esfarrapado, morto de fome e sede, numa mata próxima. Teve um fim horrível.
Nós permanecemos alguns dias em Ostende e, neste meio tempo, o agente foi procurar o armador para tratar de nossa viagem. Certo dia veio o armador pessoalmente e começou o debate e os acordos. Primeir (amente), o mesmo não estava interessado em negociar, mas, por fim concordou em aceitar 40 Taler para pessoas acima de doze anos e 20 Taler para pessoas abaixo de 12 anos. Muitos não tinham nem esta soma e novos debates se iniciaram. Por último, o armador deu-se por satisfeito com 2/3 do preço. Começou então nova negociata entre os passageiros emigrantes, quem tinha dinheiro emprestava ao que nada tinha, para pagar quando chegasse ao Brasil. Eu mesmo pedi emprestado 50 Taler para cobrir as despesas de meus pais e irmãos. Sobraram assim mesmo 11 famílias; 3 da minha região, que não conseguiram dinheiro suficiente para a passagem. Estas famílias mais tarde foram acompanhadas pela polícia até a fronteira e enviados de volta à cidade de onde vieram. Que estes tiveram um destino lamentável é compreensível, pois tinham vendido tudo o que possuíam.
Agora que a negociata com D. terminara, foram providenciadas carroças que transportavam caixas, caixotes, malas e pessoas até a cidade portuária.
Chegamos diante das portas da cidade onde a polícia não permitiu nossa entrada até a chegada do armador, para que esse assumisse a responsabilidade de todos nós, no que se referisse a alimentação. No porto estava ancorado um navio com destino ao Brasil e já algumas famílias encontravam-se nele. A este foi logo transportada nossa bagagem e nós também embarcamos, podendo pernoitar no navio.
No dia seguinte ... , o veleiro levantou âncora e partimos. Éramos 220 pessoas a bordo; todos emigrantes e fomos logo atacados pelo enjoo. Todos procuravam um canto para deitar-se. Não sentíamos nem fome nem sede. Logo que esta fase terminou e nós melhoramos, um mal bem pior nos surpreendeu. Era disenteria que uma família trouxera a bordo. Esta terrível doença atacou a quase todos, inclusive a tripulação! Que miséria reinava entre os doentes! Aqui alguém gritava por água, acolá outro pedia para morrer. Desta doença morreram durante nossa viagem (6 semanas), 27 pessoas, na maioria adultos, cujos corpos eram atirados ao mar. Numa noite, eu me lembro, 3 corpos de uma só vez foram atirados ao mar. De várias famílias morreram o pai e a mãe deixando de 4 a 5 crianças pequenas mas que logo foram acolhidas por outras famílias caridosas. Comida tinha o suficiente, mas o capitão não entregava. Mesmo para um doente não se obtinha nem um pouco de água para fazer uma sopa, imaginem outro alimento. Quando tentávamos explicar a necessidade de um doente e que o mesmo implorava por comida, ele apenas respondia: Nada! Morre! Bom para os peixes! E viravam as costas. Uma única vez, depois de implorar muito, ele me vendeu uma garrafa de vinho por 5 francos para meus pais. Mas em compensação, numa outra ocasião quando pedi água, para um doente, a xícara me foi derrubada com um tapa na mão e jogada no mar. A comida que recebíamos era demais para morrer e muito pouco para viver. Consistia em 'água com café', batatas semi-apodrecidas, um pouco de carne salgada e pão velho. Se nós pelo menos tivéssemos recebido somente pão e água, já teríamos ficado satisfeitos. Mas era água duvidosa que diziam ser café, às 10 horas da manhã, e, às 4 horas, um pratinho de água morna com pedaços minúsculos de carne salgada ou cabeças de peixes salgadas. Esta foi a alimentação dia após dia, durante todas as semanas de viagem. Como ficávamos contentes quando chovia e podíamos recolher a água e guardávamos até a última gota. Se nós tivéssemos levado tanto tempo para a viagem como outros navios que chegaram ao Brasil, isto é, 5 a 8 meses, nenhum de nós teria sobrevivido. Os que não morreram de disenteria teriam morrido de fome e de sede.
Quando a viagem já estava chegando ao fim e a miséria da comida aumentava, todos os pais de famílias e jovens postaram-se armados diante da cabine do capitão e exigiram comida e água ou se vingariam. Isto resultou em efeitos positivos. O comandante mandou buscar pão e distribuiu boa quantia a todos. Também um barril com água potável apareceu e todos puderam saciar sua sede. Igualmente a cozinha apresentou uma comida melhor, mas isto foi só um dia; depois tudo continuou como antes.
No que se refere ao tempo, a nossa viagem foi boa. Somente uma vez tivemos que enfrentar um temporal e todos tiveram que recolher-se nos camarotes. Neste temporal um mastro foi derrubado, mas não sofremos outros danos.
Certo dia, após 6 semanas em alto mar, quase mortos de fome, avistamos terra: era o Brasil. A alegria que todos sentíamos era imensa, pois agora estávamos livres da prisão e só um grito percorria o navio: Terra! Todos que podiam, arrastavam-se até o convés do navio, para certificar-se de que era verdade mesmo. A terra crescia à nossa frente e ancoramos perto da cidade. Agora estávamos num continente estranho, cheios de esperança e angústia, separados para sempre da pátria. Aqui pretendíamos encontrar a felicidade. Todos que podiam permanecer no convés admirando a grande cidade do Rio de Janeiro.
Não muito tempo o navio estava ancorado, quando recebemos, vindo em uma canoa, um alemão, que serviria de intérprete e um médico. Por estes senhores fomos interrogados sobre nossa viagem e nosso tratamento a bordo. Foi então que podemos contar tudo o que nos acontecera. Logo o médico foi visitar os doentes, dos quais ainda tinham muitos. Receitou remédios que mandou buscar na cidade. O capitão recebeu a ordem de cuidar com uma melhor alimentação, principalmente para os doentes. Esta ordem foi cumprida. A partir de então os doentes receberam, em vez de água morna, até uma canja com carne de galinha. Os outros também receberam comida melhor; repentinamente havia tudo o suficiente. Os tempos mudaram para nós. O comandante andava mal humorado pelo navio e, se pudesse, teria atirado a comida ao mar. O médico vinha diariamente visitar os doentes e verificar a alimentação. Até na cozinha entrava para ver o que estava sendo preparado para nós. Vinham também várias canoas até o navio levar frutas, principalmente bananas e laranjas, que, para nós, era a comida preferida.
Foi aqui que eu vi pela primeira vez em minha vida negros. Em cada canoa vinham 2 ou 4 remadores. Eram bem pretos, dentes alvos, cabelos crespos, estrutura robusta, sem camisas ou camisetas, só vestidos com uma velha calça até os joelhos. O calor era muito grande e o suor corria-lhes pelo corpo fazendo-os brilhar como ébano. Ao vê-los pela primeira vez, senti um calafrio percorrer meu corpo. Perguntava a mim mesmo como era possível escravizar estas pessoas, pois eram seres humanos como nós.
Dez dias tivemos que permanecer a bordo, antes que pudéssemos ir a terra. Diziam que era por causa da doença, pois os brasileiros tinham medo que a mesma se espalhasse pela cidade também. Mas eu acreditava que o motivo era bem outro e pela seguinte razão: desde que tínhamos chegado, vinha um senhor, que parecia ser um funcionário no Rio. Este homem vinha em companhia de outros e um intérprete alemão. Trazia uma grande folha de papel que estava escrito em português e alemão. O que queriam? Este senhor tinha grandes áreas de terra numa região onde fazia bem mais calor, mas do nome não me lembro. Estas terras ele queria colonizar com alemães. Eis o motivo porque trazia aquela folha de papel e que os alemães teriam que assinar. De acordo com o escrito, cada alemão receberia margem de terra para um certo preço. Os primeiros três anos nada precisávamos pagar; só a partir dos três anos, tendo 6 anos para o pagamento. Quem não tivesse feito até então o pagamento teria que pagar juros. O proprietário também prometeu uma longa ajuda em alimentos e ferramentas, que poderíamos pagar mais tarde. Teríamos que assinar o contrato e o mesmo navio nos levaria ao destino. Foi justamente a mim que escolheram para ler o papel; provavelmente acreditando que eu era o mais entendido em escrita. Depois de ter analisado tudo muito bem eu disse: 'todos podem fazer o que acharem melhor, mas eu, meus pais, meus irmãos, queremos primeiro desembarcar, estar em terra firme. Ali quero informar-me e se achar conveniente, então assinarei. Numa terra estranha não se pode assinar qualquer compromisso à primeira vista'. Depois que eu falei isto os senhores voltaram a terra. Mas, no dia seguinte, voltaram e assim faziam diariamente. Por fim viram que tudo dependia de mim e prometeram-me uma gratificação, mesmo terra sem pagamento, se eu convencesse os outros a assinar o contrato. Mas eu estava firme em meu propósito de primeiro desembarcar. Mais tarde soube por um alemão fugitivo daquela região, que, devido ao péssimo clima, quase todos morriam.
Quando o comandante viu que não chegávamos a nenhum acordo, ele nos liberou depois de 10 dias da nossa chegada. Na cidadezinha, Praia Grande, que ficava defronte ao Rio, fomos liberados. No mesmo dia o capitão mandou chamar todos ao convés e exigiu de nós o restante do frete, pois D. só tinha pagado 2/2 do mesmo. O comandante alegou que o armador lhe mandara cobrar o restante na chegada e, se não fosse efetuado o pagamento, ele podia embargar toda a bagagem. Agora o desespero era grande, ninguém tinha mais dinheiro. Os homens pediram, as mulheres imploraram, mas nada adiantou; sem nossos haveres fomos desembarcados. O que fazer agora? Para onde ir? Lá estávamos deitados todos na praia, até que alguns brasileiros acercaram-se de nós, indicando por gestos um rancho abandonado que poderíamos ocupar. Lá tínhamos que passar a noite sem comida, sem bagagem, sem cama, o que seria de nosso futuro? As mulheres começaram a lamentar a sorte, as crianças choravam, outros rezavam, outros discutiam. Algumas mães vendo o desespero dos filhos, foram a uma padaria e por sinais indicavam que queriam pão para seus filhos famintos, no que também foram atendidas.
Também eu fiquei a noite toda analisando a situação. Num país estranho, onde não se conhecia ninguém, os 5 francos que me restaram tinham ficado a bordo numa caixa. O que fazer? Mas eu tinha que encontrar uma solução! Resolvi então seguir numa das canoas na manhã seguinte até o Rio e procurar o cônsul da Prússia. O dinheiro para a canoa pediria emprestado de uma pessoa que ainda tivesse algum. Quando amanheceu fui até a cidadezinha à procura de uma canoa que me levasse ao Rio. No caminho encontrei um senhor, que pela aparência parecia alemão e o interpelei. Realmente era alemão e vivia na cidade. À sua pergunta, confirmei que pertencia ao grupo de imigrantes recém-vindos e contei-lhe nosso drama. O mesmo achou por certo procurar o cônsul e se dispôs a acompanhar-me. Antes convidou-me à sua casa para um café, o que não aceitei, explicando-lhe que precisava primeiro solucionar o problema de meus companheiros; mas eu o esperaria mais tarde no galpão. Contente regressei e contei aos meus amigos que tinha encontrado uma pessoa que nos ajudaria. Nem meia hora depois o meu conhecido chegou. Pegamos uma barcaça a vapor e fomos até o Rio. Lá procuramos primeiro o cônsul da Prússia, mas fomos muito mal recebidos por ele. Disse-nos ele que tinha outras coisas a fazer do que cuidar de imigrantes, que deveriam ter ficado de onde vieram. Quando estávamos novamente na rua, meu companheiro sugeriu procurar outro cônsul, fosse ele de Hamburgo ou Bremen ou outro europeu. Fomos bem recebidos pelo cônsul de Hamburgo. Tive que contar toda nossa viagem, o mau trato que recebemos, etc. Então soube que o armador D. Estava desacreditado pelo governo brasileiro, porque no ano anterior tinha acontecido muitas irregularidades. O cônsul pediu que nós o acompanhássemos e o mesmo nos levou para um salão onde estavam reunidos alguns senhores, que logo mostraram-se interessados em minha história. Pediram o nome do comandante e do veleiro, prometendo tomar providências e que nossa bagagem ainda seria liberada naquele dia. Contentes nos despedimos, agradecendo todas as gentilezas. Era hora do almoço e eu sentia uma fome terrível, pois não comera durante todo o dia. Meu novo amigo sofria do mesmo mal e convidou-me para comer, o que também fizemos e ele pagou a despesa.
Ao sair do restaurante, tivemos que esperar um bom tempo até a chegada da barcaça. Meu amigo mostrou-me um pouco a cidade. Vi bonitas vitrines; no mercado enorme quantidade de laranjas, das quais chupamos algumas. Meu companheiro não cabia em si de contente porque pudera ajudar-nos.
O comandante, por ordem do Rio, entregou aos imigrantes seus objetos. Mas infelizmente muito ainda faltava; algumas espingardas, tachos, panelas de cobre, caixas foram arrombadas e o conteúdo roubado. Minha própria mala, duplamente fechada fora arrombada. No dia seguinte eu pretendia procurar o cônsul outra vez para explicar o que acontecera.
Um dos males estava solucionado, mas logo apresentou-se outro. Panela tínhamos, mas nada para por dentro e com o qual pudéssemos acalmar nossa fome. Ainda vivíamos na espera de que o governo cuidaria de nós, mas estávamos enganados. Nada aconteceu. Restava apenas uma solução: mendigar, apelar para o bom sentimento dos moradores e assim fizemos. As mulheres se puseram a caminho e também foram bem recebidas; trouxeram provisões e até dinheiro.
Eu mesmo estava sentado num monte de lenha em frente ao rancho, pensando numa solução.
Estava resolvido a escrever uma carta ao imperador pedindo auxílio e eu pessoalmente entregar-lhe esta carta.
Redigi a carta, contando o que nos havia acontecido na viagem e de nossa atual situação. Depois eu queria mandar traduzir o escrito e possivelmente encontraria outra pessoa caridosa que nos ajudasse. Expliquei o plano aos meus companheiros de infortúnio e pedi que, que,m pudesse ajudasse com um pouco de dinheiro. Todos concordaram entusiasmados e conseguiram a soma de 8 mil réis. Levei mais um jovem de nosso grupo, bastante vivo para acompanhar-me. Precisávamos de auxílio para não morrer de fome. No dia seguinte partimos para o Rio, pedimos informações a um dono de restaurante alemão, sobre uma pessoa que pudesse traduzir nossa missiva e ele nos forneceu e endereçou o nome de uma pessoa capacitada em faz-l.o. Fomos procurá-lo e ele fez o que pedíramos. Pagamos 4 mil réis pela tradução e lá partimos em direção ao palácio imperial. Quando chegamos, soubemos que o imperador não encontrava-se no palácio, mas sim em sua residência em São Cristóvão, 2 horas distante do Rio. Para não perder muito tempo e chegar logo, tomamos um fiacre por 400Rs. E em uma hora chegamos ao nosso destino.
Na residência imperial, entramos primeiro num grande e lindo jardim e a primeira pessoa que encontramos foi o jardineiro, que era alemão de nascimento. Cumprimentamo-nos alegremente, contamos nossas desditas e explicamos o que queríamos. Pedimos ao jardineiro que nos acompanhasse para servir de intérprete. Não demorou muito e este regressou com a notícia que o imperador não receberia.
Quando fomos anunciados ao imperador, ficamos nervosos e nosso coração batia com força. O jardineiro, vendo nosso receio, encorajou-nos e disse que o imperador era um homem bom e compreensivo.
Mais confiantes subimos a escadaria e nos dirigimos ao salão onde estava o imperador. Logo que nos viu, veio ao nosso encontro sorrindo amável e nós nos sentimos mais à vontade. Entregamos a nossa carta que leu com atenção. Fez várias perguntas e nossas respostas foram interpeladas. O imperador prometeu ajudar-nos a tomar todas as providências necessárias para resolver nossos problemas. Satisfeitos e alegres nos despedimos cerimoniosamente e saímos. Conversamos mais um pouco com o jardineiro que nos convidara à sua casa. O caminho de regresso tivemos que fazer a pé pois como era tarde, já não havia mais nenhum fiacre.
Agora manifestava-se a fome. Compramos um pedaço de pão, um pedaço de carne e tomamos um copo de aguardente. Quando chegamos ao porto verificamos que não havia mais barcaça que nos transportasse ao outro lado. Soubemos que após as 18 horas, o preço pelo transporte estava liberado. Podiam cobrar o preço mais elevado. Como tínhamos apenas 1 mil réis, estávamos em apuros, mas nada adiantou conversar com os negros. Eles, por sinais, nos faziam entender que queriam 4 mil réis pela travessia, o que realmente não tínhamos. Perto um senhor escutou a nossa conversa sinalizada e, condoendo-se, pagou 4 mil réis e mandou que o negro nos levasse até o outro lado. Mais uma vez sentimos a gentileza dos moradores. Ao chegarmos, tivemos que contar todos os detalhes o nosso encontro com o imperador. A alegria foi total, mas cedo demais; novamente nós nos sentimos enganados. Dia após dia passava e nada acontecia. A necessidade de alimentos tornou-se tão grande, que fomos obrigados outra vez a esmolar. Havia muitos moradores que ajudavam de bom coração; outros batiam a porta quando nos viam e analisando as constantes visitas que nos fazia aquele homem, querendo que assinássemos o compromisso para ir às suas terras, me fez pensar que talvez eles estivessem impedindo a ajuda prometida. Mais uma vez resolvi procurar o imperador. Novamente fiz uma carta e mandei traduzi-la e junto com o tradutor fui procurar o imperador, que desta vez encontrava-se no palácio. Pedimos que os guardas anunciassem e recebemos permissão para entrar. Já não sentia mais receios e confiante subia as escadas. O imperador nos recebeu num grande salão, mas não estava sozinho. Vários senhores estavam presentes. Entreguei outra vez a minha cartinha, quando o mesmo veio ao nosso encontro, e uma irritação profunda espelhou-se em seu rosto,quando a leu. Chamou um dos presentes e comentaram sobre o que eu havia escrito. Em seguida se dirigiu a nós e gentilmente falou-me, pediu desculpas de que tínhamos esperado tanto tempo em vão, mas agora tudo seria resolvido; que eu fosse tranqüilo para junto dos meus. Um pedido no entanto não podia conceder; ao Rio Grande do Sul não nos poderia enviar. No entanto havia três províncias que poderíamos escolher, Santa Catarina, São Paulo e Espírito Santo. Podíamos pensar a respeito e, mais tarde quando interrogados, dizer por qual nos decidiríamos. Contentes deixamos a sala de audiência e voltamos para casa, transmitindo a mensagem do imperador. A alegria não foi tão estrondosa como a primeira, mas grande foi a satisfação que sentimos quando à tarde veio uma canoa carregada com alimento; carne, pão, café, açúcar, arroz, feijão, trigo, sal, etc.
Agora terminara nossa miséria. Todo dia vinha uma canoa nos trazer o necessário durante um mês, tempo que estávamos recolhidos à Praia Grande. Durante este tempo pesquisamos qual das três Províncias seria a melhor. Todos aconselharam a de Santa Catarina. Diziam que o clima era saudável e os alemães ainda seriam estabelecidos próximo da cidade. Por tanto nos decidimos por Santa Catarina.
Certo dia chegaram vários barcos e nossa bagagem assim como nós, fomos transportados a um veleiro brasileiro. Levantando âncoras, partimos em direção a Província de Santa Catarina. Fomos muito bem tratados; comida e água suficientes. O único problema era o espaço. O navio era pequeno para tanta gente, e a maioria permanecia no convés. Algumas vezes fomos surpreendidos por fortes chuvas e ficamos molhados até os ossos. Depois de uma viagem de seis dias, chegamos são e salvos ao porto de Santa Catarina. Ainda no mesmo dia fomos levados em barcos, com todos os pertences, até a cidade e lá instalados num grande galpão. Na cidade fomos bem recebidos, porque os alemães tinham fama de bons trabalhadores e nós éramos os primeiros a chegar depois de 20 anos.
Nos primeiros dias recebíamos diariamente mantimentos, assim como no Rio. Apesar de que nada tínhamos a reclamar da comida, para nós seria de maior valor um auxílio financeiro. Alguns dos companheiros foram procurar o presidente da Província e explicar o caso. Este ficou satisfeito porque economizaria nas contas. Agora a diária por pessoa era de 160 Rs., que pagavam pontualmente cada mês. Era em verdade muito pouco, mas dava para viver, porque os alimentos eram baratos. Muitos conseguiram trabalho na cidade durante o dia e podiam economizar um pouco para o futuro. Este auxílio recebemos por 18 meses.
Algumas horas de viagem da cidade, na estrada imperial para Lages, cidadezinha no planalto, receberíamos terra. Junto a uma estrada! Isto é de grande vantagem para a colônia, pensei quando soube da notícia. Estávamos na cidade cerca de 2 meses, quando fomos noticiados de que seríamos transferidos para nossas terras. E, realmente, no mesmo dia ainda fomos transferidos com tudo o que possuíamos no barco, para a outra margem e mais horas e horas rio acima. Ali fomos instalados primeiro em casas particulares brasileiras, até que uma família após outra fosse levada de carro de boi.
Não chegamos logo à nossa terra porque as medições não tinham terminado. Três horas de caminhada a partir do último morador e floresta adentro, fora construído um grande barco onde todas as famílias foram alojadas.
Eu me recordo da minha surpresa quando vi a estrada imperial. Na Europa eu nunca vira uma estrada tão ruim. Coberta por mato onde rasgava-se a roupa, com cada passo atolado na lama até os joelhos.
E esta era a estrada principal da Província.

...
Logo depois de minha chegada ao barraco, eu fui em companhia de meu melhor amigo, fazer uma visita a São Pedro de Alcântara, colonizada há 20 anos passados (1826) por alemães e que distava um dia de viagem da nossa. Enrolado em um pano algumas peças de roupas, nos pusemos a caminho, para chegar no dia da festa do Espírito Santo. Depois de caminhar um trecho, fomos obrigados a tirar as pesadas botas, pois atolávamos na lama a cada metro. Depois da chuva nos dias passados, os riachos estavam altos e pontes não existiam. Algumas vezes tivemos que atravessar riachos com água até o peito. Certo riacho meu amigo atravessara bem e eu valentemente o segui, mas num instante perdi o contato com o chão e fui arrastado pela água. Numa margem consegui alcançar um galho e segurar firme, depois de recuperado do susto e com o auxilio de um amigo alcancei a margem. Estava molhado até os ossos; troquei de roupa e seguimos caminho. A noite nos surpreendeu antes de chegarmos à colônia e não tivemos outra escolha a não ser procurar um abrigo. Ao longe vimos o brilho de uma fogueira e nos dirigimos para lá; encontramos dois negros junto a um fogo e por sinais lhe explicamos que queríamos abrigo, se o permitissem. Os dois concordaram e nos indicaram um lugar perto da fogueira. Cansado da viagem nos deitamos para descansar. Dormir foi impossível devido ao frio. Na Europa também senti frio, mas nada podia ser comparado com o que sentia agora. Nos sentamos junto ao fogo, aquecendo uma vez o lado direito outra o lado esquerdo, mas de nada adiantava. Os dentes batiam e quase não conseguiam pronunciar palavras. Com meu amigo acontecia o mesmo. Ficamos aliviados quando ouvimos um galo cantar. Logo que o dia clareou deixamos o rancho, pois pensar em café ou outra comida não adiantava. Quando saímos da porta, a terra sob nossos pés se partia e olhando em volta vimos tudo branco; a região estava coberta por uma grossa camada de gelo. Foi a primeira geada que vi no Brasil. Felizmente o caminho melhorava para nós e não tivemos mais que tirar as botas. Se tivéssemos que fazê-lo, ou ainda cruzar um rio a nado, teríamos morrido de frio. Ficamos felizes quando após meia hora de caminhada chegamos a uma casa cujo dono era alemão. Tiritando de frio entramos e ele nos acolheu com uma xícara de café. Também nos serviram um bom almoço e muito tivemos que falar sobre a Europa, da qual já há 20 anos não haviam mais ouvido falar.
Acendemos nossos cachimbos e novamente continuamos nossa jornada. Após uma hora alcançamos nosso destino. Na pequena colônia perguntamos por uma hospedaria, que não existia, mas os moradores contentes e hospitaleiros, chamaram-nos e ofereceram suas casas, porque todos estavam ansiosos em ouvir algo de sua terra natal.
Com a instalação e a vida dos alemães neste lugar fiquei muito satisfeito; parecia que tinha voltado para a Alemanha. No dia seguinte na festa, reuniram-se muitos alemães, homens, mulheres e crianças, todos vinham a cavalo dos lugares mais distantes para assistir os cultos nas igrejas. Tanto aqui como na Alemanha, notei que os moradores não desligavam-se dos divertimentos, pois logo que a missa terminou, o povo seguiu para o lugar de dança. Apesar da música só ser executada por uma clarineta e um violino, foi uma satisfação enorme observar o colorido e a alegria do povo. Ao anoitecer, muitos retiraram-se para suas casas e outros ficaram até amanhecer. Nós que estávamos cansados, deitamos cedo, agora numa boa cama e dormimos até que o sol nos despertou. Permanecemos alguns dias na colônia visitando um e outro colono; sempre bem recebidos. Ficamos surpresos com a boa instalação de todos, grandes e verdes pastagens com gado bonito e saudável. Com o firme propósito de trabalhar com afinco, a fim de chegar também a possuir uma propriedade tão próspera, regressamos ao nosso rancho.
Alguns dias depois desta viagem manifestei o desejo de visitar as medições das terras destinadas para nós. Parti em companhia de um jovem que já nascera aqui; queríamos chegar até onde trabalhavam os homens. Espingarda sobre o ombro, um grande facão na cintura, um saco com mantimentos, estávamos prontos para partir. Como ainda não existia uma estrada, mas sim somente uma picada, em alguns lugares tivemos que arrastar-nos no chão. Tínhamos esperança de chegarmos antes do anoitecer ao local onde os homens trabalhavam, mas assim não aconteceu. A noite nos surpreendeu e nada de homens. Eu fiquei com medo da noite na floresta, onde já durante o dia não se via nem 5 passos à frente. Tateamos ainda no escuro até que a escuridão fosse completa e nos obrigasse a ficar no lugar. Acendemos uma fogueira e pudemos ver um pouco à nossa volta. Com o clarão das chamas, vimos que estávamos próximos a um riacho, o que foi muito bom, pois pudemos saciar nossa sede e preparar algo para comer. Depois de fortificados fomos deitar. Eu não conseguia dormir com todo o ruído que o vento fazia nas folhagens. Já pensava em índios e animais selvagens; fiquei feliz quando vi o dia clarear. Partimos para nossa jornada e após uma caminhada de duas horas chegamos ao local de trabalho dos homens. Ficaram surpresos e contentes quando nos viram. Como recepção preparam uma boa xícara de café. Ficamos com eles o dia todo e também à noite. Na manhã seguinte empreendemos a caminhada de regresso bem cedo, para não sermos surpreendidos pela noite novamente.
Quando a terra terminou de ser medida, recebemos nossa parte; quanto maior a família maior a terra. Rapazes sem família recebiam 100 braças de largura e 1.000 braças de comprimento (200 margem); pais de famílias recebiam 125-200 braças de largura e 1.000 de comprimento. Agora chegou a hora de trabalho. Enquanto os pais e filhos munidos de machado, facas, foices e facão começavam a preparar a terra para construir um rancho, as mulheres e crianças pequenas permaneciam no galpão comum. Semana após semana o trabalho continuava e aos poucos o terreno ganhava forma. As casas improvisadas foram ocupadas e iniciou-se a construção do mobiliário e o trazer dos pertences até a colônia. Não era um trabalho fácil, porque o caminho era apenas uma picada. Tudo que era trazido levaria pelo menos algumas horas de viagem. Por fim tudo estava no seu devido lugar e a família pode começar a semear. Os primeiros anos foram cheios de dificuldades, mas depois também isto normalizou-se e as colheitas foram mais gordas.
Dia após dia clareava a floresta e sempre mais crescia a colheita. Muitos anos passaram-se e a colônia prosperou. Todos os colonos que vieram comigo ao Brasil prosperaram e chegaram a uma razoável estabilidade. A viagem a Desterro para a qual naquele tempo gastava-se dois dias, hoje se faz em um dia. O ditado: 'após o sofrimento segue a alegria', concretizou-se nesta colônia.
Tão pouco como eu, todos os outros sentem mais saudades da Europa. Aqui em Theresópolis, no Brasil, Santa Catarina, encontraram sua felicidade (Theresopolis, Santa Catarina, 1867).
  
Obs.: Extraído do Calendário para os alemães no Brasil. São Leopoldo: Rotermund, 1899, pp. 79 - 107, sob o título "Aus dem Leben eines Deutschen in Brasilien", organizado por H. Schauffler - professor na escola de Teresópolis. Publicado sob o título "A Vida de um Alemão no Brasil" na revista Blumenau em Cadernos, Tomo XXVIII, Nº 5, maio de 1987, pp. 153 - 163".

(http://www.tonijochem.com.br/vida_alemao_brasil.htm)